Todo mundo trai!
- Ricardo Lobo

- 1 de dez. de 2021
- 7 min de leitura
Manter um relacionamento não é uma das tarefas mais simples e fáceis do mundo. Ainda que muitas pessoas idealizem romances como o enredo de uma novela global, ou então uma daquelas narrativas brilhantes e fantasiosas da Disney, a realidade é bem diferente, requer esforço, empenho, dedicação, e, acima de tudo, humildade, e eu vou explicar o porquê de tudo isso, principalmente do último ponto.
Verdade seja dita, no início da relação, como diz aquele ditado, "tudo são flores", o casal está encantado, apaixonado, "cego" quanto às diferenças, aos defeitos, as imperfeições e as fraquezas um do outro. O livro As 5 Linguagens de Amor, escrito por Gary Chapman, best-seller ainda em 2021, apesar de ter sido escrito em 1992, apresenta, mesmo que sem um profundo embasamento científico por trás, diversas informações e conceitos muito relevantes acerca disso, convenientes de serem aqui brevemente debatidos e discutidos.
Segundo o autor, existe algo que ele intitula como "janela da paixão", que seria justamente o período onde, literalmente, "o amor é cego", ou melhor, falando de forma verdadeira e honesta com você que está lendo, o casal se nega a perceber e aceitar as diferenças que podem impactar negativamente e comprometer o sucesso da relação, acreditando justamente naquelas ideias fantasiosas e utópicas de que o amor supera tudo.
Pense no seu próprio relacionamento, ou, caso não esteja em uma relação hoje, pense em algo que já viveu. Não era, ou foi, exatamente assim? No primeiro ano, são celebrados os meses, com um entusiasmo indescritível. 1 mês, 2 meses, 3 meses, a cada mês uma comemoração e uma dedicatória diferente, um 'mêsversário' especial...até que chegue o final do primeiro ano, e, consequentemente, as comemorações vão diminuindo. Passam a se celebrar apenas os anos, até que, mais tarde, muitos casais já nem celebram mais a data, afinal de contas, "se veem todos os dias". Comemoram, quando muito, as bodas de casamento, e, ainda assim, em muitos casos nem pelo próprio desejo, mas sim pela pressão familiar, louca para festejar e celebrar a união dos outros, pois a sua muitas vezes está ruim ou sequer existe.
É claro que não é assim sempre, a generalização nesse caso seria um extremo, e você que me acompanha sabe o que penso com relação aos radicalismos, e de que forma todo o excesso esconde algum tipo de falta. No entanto, infelizmente, é isso que observamos atualmente na maior parte das vezes. A paixão, embora muitas pessoas custem a acreditar, não dura para sempre. Por outro lado, é possível amar para sempre. Mas você percebe? Amar é um verbo, e, portanto, requer ação. Eu amo, tu amas, nós amamos...
Diversas pesquisas constataram, e seguem constatando, historicamente, que um dos maiores medos, tanto de homens quanto de mulheres, ao estarem em um relacionamento, é o medo de serem traídos e/ou abandonados. Porém, a verdade é que todo mundo trai e é traído, todos os dias, e eu posso provar isso com exemplos que certamente você irá se identificar.
A relação entre casais nos dias de hoje é tão bizarra e incomum que não existe mais uma relação monogâmica, entre um homem e uma mulher, ou mulher e mulher, homem e homem. Agora, todas as relações são poligâmicas, pois, acrescente ao casal, dois celulares. Não é assim que funciona? Como é o café da manhã no seu relacionamento? Vocês conseguem tomar café da manhã e conversar sobre os assuntos do cotidiano, sejam eles sérios ou triviais, ou ficam apenas como 'dois estranhos', unidos apenas pela proximidade material, de dois corpos, mas totalmente isolados de alma um do outro? Qual foi a última vez que tomaram café da manhã sem a interrupção de algum aparelho eletrônico?
Não é apenas o celular, mas coloque aqui também, nesse mesmo contexto, qualquer outro aparelho eletrônico, como uma televisão. Certamente, no começo da relação, por mais simples que fosse, este era um momento especial e lindo de ser vivido. Fazia-se questão de dividir a mesa de café de manhã, sem nem aqui considerar as vezes em que um ou outro surpreendeu seu parceiro ou sua parceira com um café na cama. Quando se pegava o celular, era, no máximo, para mostrar ao parceiro ou a parceira algo que fosse de interesse mútuo, que era visto com as mãos entrelaçadas, a mão desocupada fazendo carinho ou cafuné. Não era, lógico, algo que se fazia com a mesma facilidade de tomar um banho ou escovar os dentes. Era algo que exigia esforço, empenho, dedicação, exigia abrir mão de si para servir ao outro. E era algo prazeroso de ser feito, pois havia uma reciprocidade, com ambos abrindo mão de si e do seu egoísmo, do seu "eu", para nutrir o "nós". Porém, pouco a pouco, a paixão vai se esvaindo (leia-se: deixa de existir esforço), as coisas vão esfriando, "verdades até então ocultas", que ambos se negavam a perceber, aparecem, e as coisas começam a complicar.
Trair não é apenas "pular a cerca", manter um relacionamento extraconjugal. Existem vários tipos de traição. Colocar o celular como prioridade em uma relação, deixando o cônjuge em segundo plano, é uma traição tão dolorosa e tão cruel quanto a mais tradicional, capaz de gerar enormes e profundas sequelas. Não existe falta de tempo, existe falta de interesse. Existe falta de esforço, de empenho e dedicação. No início, por exemplo, ambos se interessavam pela vida profissional um do outro, faziam questão de conversar, discutir ideias, encontrar soluções, pensar no futuro. Agora, aquele interesse de antes se resume aquela clássica pergunta: "como foi seu dia?", feita mais por obrigação do que por vontade. Se faz a pergunta apenas para descargo de consciência, muitas vezes sequer se presta atenção na resposta, buscando algum tipo de interação adicional. Muitas vezes, se responde "legal", já com o celular a postos. Por outro lado, existe tempo para acompanhar notícias totalmente irrelevantes do mundo dos famosos, a rotina de alguma digital influencer, ou algo relacionado ao mundo dos esportes e do futebol.
E é justamente assim, pela falta de esforço, empenho e dedicação, pela traição diária, nos pequenos cuidados, que muitos casais optam pelo encerramento de uma relação. Claro que existem situações onde o término se faz e se mostra necessário, sendo melhor, não apenas para o casal, mas também para a vida individual de cada um. Cada um sabe da sua realidade e dos seus sentimentos. Porém, na maior parte das vezes, não é o "amor que acabou", como muitos argumentam por aí, mas sim, sinceridade à parte, "vocês que deixaram de amar". O casal que deixou de se esforçar, se dedicar e se empenhar, agora colhe os frutos de suas próprias atitudes e de seus próprios comportamentos.
E por que, no início do texto, falamos sobre humildade, como esse sendo o pilar mais importante de tudo que estamos falando? É possível que muitas pessoas, ao lerem tudo isso que foi dito até aqui, tomem posse de sua arma metralhadora e passem a disparar para o seu parceiro ou para sua parceira, dizendo coisas como: "tá vendo, nosso relacionamento tá essa m... porque você isso ou você aquilo", "porque você deixou de fazer isso ou aquilo". Esse tipo de pessoa talvez deva se graduar em Direito e fazer concurso para o cargo de Juiz, pois está apta a criticar, reclamar, controlar, mas é incapaz de ter empatia, de se colocar no lugar do outro, e, acima de tudo, de reconhecer aquilo que é seu, que é sua responsabilidade, de que forma suas próprias atitudes contribuíram para o enfraquecimento da relação. É incapaz de mudar, assumindo um comportamento "pobre de mim".
Claro, em tempos de extrema oferta e abundância, com aplicativos de relacionamento funcionando quase como um cardápio, com valores sociais e culturais sendo invertidos a todo instante, em uma distorção absurda defendida por algumas ideologias, novelas e séries, de enorme audiência, pregando esse tipo de narrativa, é muito mais fácil trocar de relacionamento do que trocar de comportamento. Mas há um problema nisso tudo: a pessoa que muda de relacionamento, e não é capaz de mudar o seu comportamento, vai sempre trocar de relacionamento, cada vez com mais frequência, não conseguirá construir algo realmente saudável e sólido a longo prazo. Se for esse o desejo, ok, mas eu tenho quase certeza que, bem no fundo, mesmo que não admita, não é.
Qual é o cenário ideal, portanto? Será que existe uma "fórmula mágica"? A verdade é que de mágica não existe nada, mas, com ambos dispostos a crescer, mudar, evoluir, tendo a humildade de reconhecer seus erros, de trabalhar para corrigi-los, de se tornar mais maduros, conscientes, fortes, no sentido emocional, cada um querendo melhorar a si, já é um grande avanço. Se apenas um busca melhorar, se apenas um por exemplo busca terapia, e o outro não faz nada para mudar suas atitudes, assume uma postura de vítima, acreditando que o problema é sempre externo, mas jamais interno, além de não ter humildade, não faz esforço. Vai ser como uma pessoa caminhando com um saco de cimento de cinquenta quilos preso às canelas, incapaz de ir para a frente. E, como você viu, sem esforço, dedicação, empenho e humildade, o relacionamento caminha a passos largos para o seu fim. Cada um precisa ter a humildade de olhar para dentro de si, entender minimamente que deve mudar a si, e não ao outro, em prol do relacionamento.
A grande maioria dos casais de todos os povos e culturas não destrói seus romances porque não iniciou sua história com amor, mas porque seu amor não foi irrigado diariamente com doses generosas de inteligência.
Quer construir um relacionamento realmente saudável? Mude, mapeie suas falhas e reescreva-as. Olhe para a sua história, adquira maior consciência sobre si. Pare um pouco de criticar e apontar as falhas do outro, comece a celebrar os acertos. Mude, e se esforce, "simples" assim.
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