Sabe o que é amor próprio?
- Ricardo Lobo

- 5 de nov. de 2021
- 4 min de leitura
Eu acho fofo, para usar um termo educado, que atualmente as redes sociais estejam repletas de postagens e cards motivacionais refletindo sobre a importância do amor próprio. Se pensarmos ao pé da letra, realmente, precisamos nutrir urgentemente a capacidade de se amar. É o mais importante, é algo que a própria Bíblia cita: quem não se ama não sabe amar os outros!
No entanto, até que ponto o discurso virtual corresponde à prática? Até que ponto aquilo que está colocado nas redes sociais é realmente confirmado no mundo real? Será que de fato as pessoas nutrem internamente essa capacidade de se amar?
Vivemos em um mundo onde, infelizmente, desde muito cedo, o erro é apontado como algo negativo, pesado, um vilão. Quem erra está sujeito aos julgamentos alheios, passa a impressão de possuir um valor mais baixo quando comparado a quem acertou, como se fosse alguém inferior, que estivesse aquém. É assim de forma até mesmo cultural. Em nossa sociedade, lamentavelmente, consideramos haver apenas ganhadores e perdedores, mas desconsideramos a ideia de existirem aprendizes. Por isso, errar se torna 'imperdoável'.
Porém, se você pensar bem, o erro é necessário, é fundamental. É ele, quando visto de forma adulta e consciente, que nos faz modificar, é ele que nos permite corrigir um caminho, mudar um comportamento, é ele que nos possibilita amadurecer. Não há vida sem erros e falhas, sem imperfeições e vulnerabilidades. No entanto, por mais que isto seja dito, socialmente falando, pelo ambiente e pelo modelo que desde muito cedo fomos criados, idealizamos por uma perfeição que só nos aflige e angustia, uma perfeição inexistente, incapaz de ser alcançada.
Feitas essas considerações iniciais, que servem para ilustrar a situação de uma forma ampla, precisamos lembrar, primeiro, que não temos a menor condição de mudar a sociedade, mudar as outras pessoas. É impossível. É assim, lamentavelmente, talvez cruelmente, e é preciso conviver com isso. O que realmente está ao nosso alcance é mudar o nosso próprio comportamento e a nossa própria postura, aprendendo a como lidar melhor com tudo isso, e, mais do que isso, não agir no piloto automático, de forma inconsciente e prejudicial a nós mesmos e aos outros.
Então, voltando agora à questão inicial, à pergunta de até que ponto o que se vê nas redes sociais corresponde ao mundo real, seja extremamente sincero(a): como você lida com seus erros? Além disso, você se permite descansar e ter momentos de lazer? Se permite rir da vida? Ou isso tudo é algo um tanto distante, sendo que você vive, na prática, em estado de tensão, ansiedade, achando que precisa dar conta de tudo e ser impecável o tempo todo?
Como diz aquele provérbio antigo, sempre existe uma sarna para se coçar. Se estamos em casa, sempre há um cômodo que precisa ser limpo e melhor organizado. Se estamos trabalhando, sempre tem aquela mensagem ou email que precisamos enviar para adiantar alguma coisa. Se estamos exercendo a maternidade/paternidade, sempre haverá algo para fazer com ou pelos nossos filhos. Nunca seremos bons o suficiente. Sempre, em qualquer cenário, em qualquer circunstância, teremos o que fazer. Não teremos, no entanto, condição de fazer tudo, o tempo todo. É humanamente impossível. Mas, por mais simples que isso possa parecer, é uma questão extremamente complexa, de difícil entendimento psicológico, tendo em vista a culpa inconsciente que diversas pessoas carregam.
Mais do que falhar e errar em alguns momentos, em outros estaremos tristes, indispostos, desmotivados, doentes, e é assim mesmo. Assim é a vida, apresentando sempre suas nuances, suas exceções para cada regra, fatos e circunstâncias que fogem do nosso alcance e de nosso controle.
Portanto, se você é daquelas pessoas que passa se exigindo, passa se cobrando, passa aspirando por uma perfeição, sendo quase um tirano com você mesmo(a), alguém extremamente rígido(a), inflexível, autoritário(a), sem a capacidade de lidar com as suas falhas e com as suas imperfeições, sem a capacidade de se permitir descansar, pode ter a certeza que você não entendeu ainda o que é nutrir amor próprio. Desculpa a sinceridade, mas você não se ama!
Se fosse ainda o fato de apenas não ter entendido, tudo bem, dos males o menor, como diria o poeta. Mas existem consequências ainda mais nocivas. Você projeta essa rigidez sobre os ombros de terceiros, exigindo, cobrando, ficando viciado(a) em reclamar, em considerá-los culpados, em achar que tudo e todos são a todo instante insuficientes, e isso tudo apenas prejudica qualquer relação que você viva.
Você até pode criar justificativas socialmente aceitáveis para agir desta forma, argumentos bonitinhos, dizendo que é pelo bem geral, mas, no fundo, é pela sua própria inflexibilidade, que talvez esteja inconsciente e você ainda não esteja sendo capaz ou não esteja preparado(a) para enxergar.
E aí, como grand finale, você confundirá amor próprio com egoísmo, justificando o fato de se recusar a enxergar suas vulnerabilidades, somado a dificuldade de aceitar os outros como realmente são, com aquele discurso lindo de redes sociais: "eu não preciso disto, eu me amo, eu me basto, eu tenho amor próprio." Verdade seja dita, você não tem amor próprio, é apenas mais uma pessoa egoísta e incapaz de olhar para dentro de si.
Você realmente sabe o que é ter amor próprio?
Se amar não é apenas olhar para as suas virtudes, mas também aceitar as suas fraquezas, e, também, aceitar as fraquezas dos outros. Aprenda a se amar, aprenda a se aceitar, olhe para a sua história, busque as origens, as causas, dê um novo significado. Você só conseguirá ter amor próprio no momento em que entender que você, assim como as demais pessoas, é alguém imperfeito(a), e souber lidar com isso de forma natural.





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