Pais inteligentes formam sucessores, não herdeiros!
- Ricardo Lobo

- 16 de nov. de 2021
- 5 min de leitura
Não sei se você é pai, mãe, ou, caso não seja, se um dia sonha em ser. Fato é que há alguns dias recebi uma pergunta de uma seguidora, mãe de uma pequena criança, pela caixinha de perguntas que volta e meia coloco em meu Instagram: "o que você acha da educação positiva?".
Na ocasião, até mesmo pelo espaço limitado da rede social, respondi de forma breve, mas aqui faço questão de ampliar um pouco a conversa sobre o assunto. É louvável, lógico, que mães e pais busquem conhecimento, leiam, desejem aprender e troquem experiências, com o intuito de criarem filhos bem preparados, maduros, socialmente aceitáveis para o mundo. Nesse exato momento, inclusive, estou lendo o livro Inteligência Emocional e a Arte de Educar Nossos Filhos, de 1997.
No entanto, por mais que, por trás de cada metodologia, principalmente dessas que atualmente estão mais em voga, independente de sua nomenclatura, seja a de educação positiva, comunicação não violenta ou disciplina positiva, existam muitos argumentos e fundamentos válidos e bem estruturados, exercer a maternidade e a paternidade se resumem, de forma básica, a um único pilar: sentimento.
Antes de qualquer metodologia, pais e mães precisam aprender a sentir. Essa busca simplificada por algum método, por alguma estratégia eficaz, por um passo a passo, uma espécie de guia ou protocolo, desprezando o fato de que cada criança possui suas próprias singularidades, sendo única em sua existência, é, no mínimo, para eu ser educado e fofo na forma de escrever, burra. É um reflexo de uma sociedade autossuficiente, preguiçosa, que despreza a importância do autoconhecimento, buscando sempre pelo caminho mais simples.
Criar filhos é, sem nenhuma dúvida, um processo exaustivo, estressante, que exige muito de cada pessoa envolvida. O erro, em meio a esse processo, faz parte, é claro. É impossível que não haja. Pais e mães não são apenas pais e mães, mas seguem tendo suas rotinas sociais e profissionais, e estão, com isso, como qualquer outra pessoa, tanto as que tem como as que não tem filhos, suscetíveis a dias ruins, privação de sono, acúmulo de cansaço físico e mental, frustrações. São apenas alguns dos fatores que fazem a pessoa, em muitos momentos, não agir dentro de sua melhor versão.
Filhos, desde o primeiro minuto de vida, desde quando saem do ventre de suas mães, precisam de amor, de rotina, mas também precisam de limites, por mais que os limites dados não sejam os mesmos a um bebê recém-nascido e um adolescente de 14 anos, é lógico. E qual é a única forma de conciliar todas essas necessidades, amor, rotina e limites? Sentindo! É fundamental sentir quando se faz necessário flexibilizar uma rotina, quando se faz necessário falar um "não", quando é preciso abrir mão e modificar o que havia se pensado inicialmente, enfim, é preciso sentir. E, claro, para que tudo isso se torne viável, é preciso, em primeiro lugar, libertar-se do sentimento de culpa, do sentimento de que é preciso dar conta do recado o tempo inteiro, ansiando por uma perfeição que na prática não existe.
O sentimento de culpa, muito presente em pais, e principalmente em mães, de acordo com inúmeras pesquisas, muitos tentam justificar com frases bonitinhas e agradáveis do tipo "quando nasce uma mãe, nasce uma culpa". No entanto, essa afirmação, do ponto de vista psicológico, e isso é um fato, não uma opinião, é 100% falsa. A verdade é que a pessoa já é, na vida, mesmo antes dos filhos, algoz de si mesma, não se permitindo errar, não tolerando suas próprias falhas, fraquezas e vulnerabilidades. E, ao exercer sua maternidade ou paternidade, esse padrão apenas se potencializa e aparece com maior intensidade. É como se a culpa estivesse adormecida, sem situações que a desafiassem aparecer, mas, no fundo, ela sempre esteve lá.
Pior ainda é que, quem é algoz de si, via de regra, é implacável com os outros, não aceitando que absolutamente nada saia em desacordo às suas idealizações. Não poderia ser diferente, não é mesmo? Se a pessoa não aceita tranquilamente o que é falho nem em si, como aceitará em alguém "estranho"? Seria mais ou menos como aquela famosa frase de Homer Simpson, do programa os Simpsons: "se a culpa é minha, eu ponho em quem eu quiser". São pessoas que vivem como juízes e juízas, buscando sempre um vilão, mas não sabem viver como maridos e esposas.
Crianças, por outro lado, são absolutamente sensitivas. Podem até não entender de forma clara e lúcida o que está acontecendo, pelo menos não com a percepção de um adulto, mas sentem. Adultos é que, ao passarem por diversas situações ao longo de suas vidas, positivas e negativas, muitas vezes se tornam autossuficientes e somente racionais, não sendo mais capazes de sentir. Crianças, no entanto, sentem. Elas sentem quando os pais estão cansados, estressados, quando o ambiente está carregado, quando as palavras são ditas de forma atravessada e com raiva, e assim por diante. Isso é assim desde o primeiro minuto de vida.
Por isso, saiba que, desde o primeiro momento de vida, tudo aquilo que você faz está contribuindo para a formação da personalidade de seu filho. Nada adianta, por exemplo, ser uma pessoa ativista social, defensora de alguma bandeira ou ideologia, conversar mais tarde com o filho sobre política, sobre pautas sociais como machismo ou feminismo, se, na prática, o casal grita e se ofende na sua frente, ou mesmo se um ou ambos vivem apontando as falhas um do outro na frente da criança. O "normal", primeiro sentido pelos exemplos, que ele/ela enviará ao seu inconsciente, e depois replicará em sua vida adulta e em seu comportamento com os outros, é de que brigas são normais, e sempre deve haver um(a) culpado(a).
Muito mais do que palavras, pode ter certeza que os comportamentos têm um peso mil vezes maior. É claro que a vida não é um mar de rosas, existem diferenças, conflitos, momentos em que é preciso discordar, debater ideias a fim de encontrar um melhor caminho. No entanto, é possível fazer tudo isso sem que a criança esteja junto, sem alterar o tom de voz, passando a ela o exemplo, fazendo-a sentir que adultos, de forma responsável e madura, resolvem seus problemas na ausência, e não na presença de uma criança.
Não brigue na frente dos seus filhos, não grite com seu(sua) parceiro(a) na frente de seus filhos, não fique colocando a culpa nos outros. Pais inteligentes formam sucessores, não herdeiros. Você precisa aprender a sentir, aprender a conviver de forma saudável com a culpa, com o erro. Precisa parar de ser algoz de si, implacável também com os outros. Se não possui disposição para fazer isso por você, faça, pelo menos, pelo(a) seu(sua) filho(a). É, no final das contas, sobre o comportamento dele(a) que estamos falando. Você quer criar alguém que vive colocando a culpa sobre os outros, que possui baixa tolerância à frustração, ou quer criar alguém responsável, que saiba expor e não impor as ideias, que aprenda a lidar com as próprias falhas? Dê o exemplo. Aprenda a sentir, sem se apegar a algum tipo de protocolo. Faça seus filhos serem pessoas que você admire dentro dos seus valores, para que o mundo os admire também.





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