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No que eu posso ajudar você?

"No que eu posso ajudar você?". Quando estamos a passeio no shopping, e resolvemos entrar em uma loja de departamento para dar aquela famosa 'olhadinha', é normal depararmos com um time grande de vendedores, posicionados com sangue nos olhos, como se estivessem esperando pela entrada de sua presa, fazerem logo essa pergunta, não é mesmo?


Muitas vezes, acredito até que na maioria das vezes, embora essa estatística seja da minha cabeça, a resposta é "vou apenas dar uma olhadinha" (ao menos observando o meu próprio comportamento, é assim). Alguns entendem, outros ficam naquela perseguição, tentando puxar assunto. Mal se pode tocar em um item da loja, que lá vem o vendedor falar dos seus diferenciais e o que existe na loja de opção semelhante ou complementar. Não há nada mais chato, inoportuno e deselegante que isso.


Talvez até comprássemos algo, mesmo que não tivesse sido essa a nossa intenção inicial, mas a postura foi tão inconveniente que a nossa vontade é sair logo dali para seguir o nosso passeio sem que aquilo se transforme em uma experiência estressante e traumática.


Muitas pessoas que trabalham com venda recebem todo o tipo de treinamento a nível técnico e operacional, com várias e várias estratégias e táticas de venda modernas (e isso eu falo com conhecimento de causa). Não recebem, porém, treinamento, mesmo que básico, sobre como lidar com as pessoas, como respeitar os sentimentos e as vontades das pessoas, respeitando seus desejos e necessidades. As metas e o faturamento pressionam a ponto do atendimento ser quase a ação de um robô desesperado, precisando vender o que a pessoa precisa e até o que a pessoa não precisa, sempre objetivando manter o emprego.


Se tem uma coisa, que é básica, mas que precisa ser dita, é que só pode ser ajudado quem QUER SER AJUDADO. Se eu entro em uma loja para dar uma olhadinha, é porque eu realmente quero dar uma olhadinha. Agora, se durante essa olhadinha eu mudar de ideia, e me interessar em algo, com certeza buscarei o suporte de quem estiver atendendo. Isso é básico!


Só pode ser ajudado quem quer ser ajudado! Mas você deve estar pensando e se questionando: o que isso tudo tem a ver com terapia e comportamento? Pois bem, a terapia (aliás, tudo na vida) segue exatamente a mesma lógica. Eu, como profissional, só posso ajudar quem realmente quer ser ajudado.


O número de pessoas que faz terapia no Brasil, por mais que tenha aumentado consideravelmente ao longo do período de pandemia, ainda é extremamente baixo, aproximadamente 3% da população. 97% não faz absolutamente NADA!


Muitas pessoas, em especial aquelas que jamais fizeram terapia, e nem sabem como funciona ou o que falar, buscam a terapia com um objetivo claro em mente: querem que o profissional endosse seus comportamentos e suas atitudes. Apontam o dedo como se fosse uma metralhadora para o mundo, culpando ou reclamando de pais, colegas de trabalho, maridos, esposas, filhos, amigos, governos, sempre com a expectativa de que seja dito "você tem razão, está certo (a)".


Porém, isso não é terapia. O profissional é sim solidário, empático, compreende os sentimentos, mas a medida que o processo avança, coloca a pessoa em uma posição de reflexão, de dúvida, para que ela possa, de uma forma estruturada, através de um processo elaborado, se dar conta de suas ambivalências, contradições, incoerências, e, ao fazer isso, buscar com que se aumente a consciência sobre determinado tema ou padrão comportamental para que de fato possa se iniciar uma mudança, em prol de sua evolução, para o bem, para o seu próprio crescimento. É passar para a consciência tudo aquilo que muitas vezes é inconsciente.


Só que, ao fazer isso, é preciso que a pessoa esteja disposta a assumir a sua própria responsabilidade perante a vida, algo que assusta. É muito mais cômodo, mais fácil, mais confortável, viver a vida com um papel de coadjuvante. Dessa forma, sem assumir o protagonismo, fica tranquilo de apontar o dedo ao invés de olhar para o seu próprio interior.


"Como assim, eu tenho que mudar? Isso é para os outros, porque eu estou certo (a)!". Esse é o pensamento da grande maioria. Basta pensarmos naquelas pessoas, que atualmente estão em número cada vez maior, que mal podemos contrariar ou falar algo que seja no intuito de ajudar ou chamar atenção, apontar um erro, uma incoerência, que logo já se sentem magoadas, ofendidas, e começam a apresentar mil argumentos (ou até mais) para que os outros sejam vistos como culpados, como responsáveis pela sua dor.


É por isso que algumas pessoas, no caso da busca pela terapia, criam barreiras, obstáculos, tentam criar argumentos socialmente aceitáveis, como os clássicos "não tenho tempo", "não tenho dinheiro", ou "estou bem, não preciso de terapia"(frase dita mesmo que se viva em uma crise silenciosa). Clinicamente falando, o nome disso é resistência. Somos resistentes à mudança.


No entanto, não custa reforçar que, sem uma mudança, tudo aquilo que incomoda hoje, sem que se olhe para dentro, seguirá incomodando amanhã, talvez de forma ainda mais intensa e prejudicial, causando ainda mais angústia, ansiedade, sofrimento e tristeza.


O profissional, porém, assim como qualquer pessoa, em qualquer situação da vida, só consegue ajudar quem quer ser ajudado! Aquela pessoa que não está disposta a reconhecer aquilo que é seu, assumindo a responsabilidade total perante à desordem da qual se queixa, como certa vez disse Freud, não há muito o que se possa fazer.


A pergunta que fica é: eu posso ajudar você ou você está apenas dando uma 'olhadinha'?

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